Maria das Dores Santana, carinhosamente chamada de Dadá, foi uma figura marcante no Centro de Manaus

Maria das Dores Santana, carinhosamente chamada de Dadá, foi uma figura marcante no Centro de Manaus. Quem frequentava a região da Caixa Econômica, da Sete de Setembro, da Matriz ou a Igreja de Nossa Senhora Aparecida certamente já a viu. Sua presença chamava atenção porque ela nasceu sem braços e sem pernas, consequência de uma doença rara nunca totalmente diagnosticada. Apesar das limitações físicas, construiu uma trajetória de resistência e fé.
Dadá nasceu em Milagres, no Maranhão, em uma família humilde com seis irmãos. Desde cedo enfrentou barreiras que poderiam ter paralisado sua vida, mas ela se manteve firme. Aos 19 anos, teve seu único filho, Hélio, fruto de um relacionamento breve. Nos anos 90, mudou-se para Manaus com o filho e um irmão de criação. Recebia uma pensão concedida no Amapá, que era sua principal fonte de renda, complementada por doações.
Morou em bairros periféricos como Tancredo Neves e Novo Israel. Apesar de ter recebido a promessa de um terreno e apoio do então prefeito Alfredo Nascimento, as ajudas oficiais nunca se concretizaram de forma efetiva. Com esforço e pouco dinheiro, conseguiu levantar uma pequena casa de madeira.
No Centro, ficou conhecida por desenhar com a boca, técnica que aprendeu sozinha. Seus desenhos sensibilizavam quem passava e garantiam algum sustento. Porém, com o tempo, seus dentes foram se deteriorando e ela perdeu a capacidade de continuar pintando, o que lhe causou grande tristeza.
Apesar das dificuldades, mantinha bom humor, fé em Deus e devoção a Nossa Senhora Aparecida. Também era apaixonada por futebol, torcedora fervorosa do Flamengo. Entretanto, sua rotina era marcada por perseguições de assistentes sociais e acusações injustas de que teria uma aposentadoria alta, quando na realidade sobrevivia com pouco mais de 600 reais.
Um episódio relatado em 2017 por um casal mostra o quanto sua vida era dura. Dadá contou que uma falsa amiga havia feito empréstimos em seu nome, reduzindo drasticamente sua aposentadoria, deixando-a com apenas R$ 150,00 mensais. Além disso, foi roubada e perdeu suas roupas. Seu filho, alcoólatra, a acompanhava e ajudava dentro de suas limitações.
Mesmo assim, Dadá abençoava quem se aproximava. Sua presença transmitia uma mistura de dor e esperança. Em 2018, após dar entrada no Hospital 28 de Agosto com pneumonia, não resistiu a uma parada cardíaca e faleceu aos 62 anos.
Sua morte foi lamentada, mas sua história permanece como exemplo de luta contra o abandono social e a negligência do poder público. Dadá não pedia luxo: queria dignidade, uma casa terminada, uma cadeira de rodas adequada e cuidados médicos. A memória de Maria das Dores representa tantas vidas invisíveis nas cidades brasileiras, que sobrevivem com fé, mesmo quando o mundo lhes vira as costas.